terça-feira, 3 de novembro de 2009

TWITTER VIRA ARMA CONTRA LEI SECA


AVISO DE BLITZES NO TWITTER
Autor(es): Adriana Bernardes
Correio Braziliense - 03/11/2009

Ferramenta da internet virou território fértil para os que insistem em beber e dirigir. Eles criaram uma página, que tem mil seguidores, para alertar sobre os locais onde ocorre a fiscalização no DF

Fotos: Daniel Ferreira/CB/D.A Press
Patrícia e Marília: de olho nas mensagens que chegam pelo celular e que informam locais onde ocorrem blitzes
Alex, Marcelo e Guilherme (ao fundo) usam estratégias diferentes para não ter de enfrentar a fiscalização

Nem amigo da vez nem suco de laranja a noite toda. Trocar o bar mais badalado da cidade por outro perto de casa, só para evitar a blitz da lei seca, nem pensar. No Distrito Federal, há quem faça qualquer coisa para não abrir mão de beber e voltar para casa dirigindo. Depois da corrente do goró, bem no comecinho da lei seca, a moda agora é consultar o Twitter — um microblog — para fugir da fiscalização. Mas isso é apenas um item de uma lista enorme de estratégias para burlar a fiscalização. Há quem conte até com a ajuda divina de São Pedro.

A página do Twitter que alerta sobre blitzes tem mil seguidores, fato comemorado na última quinta-feira com a seguinte mensagem. “Galeraaa , conseguimos a meta estabelecida, a partir de agora é só aumentar, cobertura total em BSB, vamos q vamos....”. O princípio é o mesmo da corrente do goró, apelido às mensagens trocadas pelo celular. No caso do Twitter, só manda mensagem quem é registrado. E para ler a informação é preciso acessar a internet.

Apesar de se propor a avisar sobre blitzes, na página tem mais mensagem de convocação para que mais pessoas “dedurem” os pontos de fiscalização do que efetivamente informações sobre onde ocorrem. Durante o mês de outubro, os usuários informaram a ocorrência de 10 blitzes e o mesmo número de locais onde ocorrem com frequência.

Há quem use mecanismos mais simples. Um telefonema, por exemplo. Ou uma mensagem de celular. É o caso das amigas Patrícia Lisboa, 26 anos, professora, e Marilia Vieira, 25, secretária. Patrícia mora do Guará e Marília, em Sobradinho. “Eu já mandei e recebi mensagem avisando sobre blitz. Isso é muito comum”, diz Patrícia. Já Marília procura caminhos alternativos para voltar para casa dirigindo depois de ter bebido. “Tem lugar que eles nunca fazem blitz. É só você não passar pelos locais críticos que nunca vai ter problema”, diz.

São Pedro
Há quem despreze a tecnologia e aposte na ajuda que cai do céu: a chuva. E até quem se proponha a vencer os fiscais pelo cansaço. O estudante Guilherme Gonçalves, 23 anos, garante: com chuva, pode voltar dirigindo tranquilo porque não tem blitz. “Mas não pode ser qualquer chuvinha. Tem que ser aquela que te deixa com preguiça de sair de casa. Não chega a ser um incentivo para ir para a balada. Mas é uma solução porque o policial não fica fazendo teste de bafômetro debaixo de chuva”, afirma.

Amigo de Guilherme, o também estudante Marcelo Rolim, 23, mapeou bares e quadras onde sempre têm fiscalização. Nas noites em que bebe e volta dirigindo evita passar pelas quadras 205, 402/403 Sul e Pontão do Lago Sul, por exemplo. “Mas no Eixão nunca tem blitz. Na W3 e L2, é muito difícil”, assegura. A aposta do estudante Alex Chaves, 22, é na credibilidade dos casais. “Quando tem casal no carro é mais difícil de ser parado. Mas se tem só macho, é fatal. Os agentes não perdoam”, diz.

E as estratégias não param por aí. Ficar na balada até 4h é outra tática adotada por motoristas que beberam e terão de voltar para casa dirigindo. Eles garantem que, nesse horário, não tem fiscalização. O advogado Antônio (nome fictício), 32, parte do princípio de que a proibição estabelecida pela lei seca é ilegal. “Já fiquei em bar até as 4h, em plena terça-feira, esperando uma blitz acabar. Um amigo meu já passou dois carros por blitzes. Ele saiu primeiro, caiu e o teste deu negativo. Deixou o carro longe, voltou a pé para buscar outros dois que estavam no bar”, contou.

Tanto o gerente de Fiscalização do Departamento de Trânsito (Detran), Silvain Fonseca, quanto o comandante do Batalhão de Polícia do Trânsito (BPTran), coronel Ricardo Cintra, asseguram que as estratégias dos motoristas para burlar as blitzes são insignificantes. “A gente fica duas, três horas em cada ponto. Numa noite cobrimos pelo menos 15 regiões. Se escapa de um cai em outro”, afirmou o coronel Cintra. “Esse tipo de iniciativa não preocupa de forma alguma. São tão ineficientes que o número de autuações só tem aumentado. De junho do ano passado para cá, já flagramos mais de 5 mil condutores alcoolizados”, finalizou Fonseca.

Tolerância zero
Lei seca é como ficou conhecida a Lei Federal nº 11.705/08, que instituiu a tolerância zero à mistura álcool e volante. Entrou em vigor em 20 de junho do ano passado e tornou mais rígida a punição aos infratores, transformando em crime o ato de dirigir com concentração de álcool igual ou superior a 0,3 miligrama por litro de ar expelido dos pulmões, por exemplo.

Esse tipo de iniciativa não preocupa de forma alguma. São tão ineficientes que o número de autuações só tem aumentado
Silvain Fonseca, Gerente de Fiscalização do Detran/DF

Página do Twitter que fala da lei seca: informes sobre os pontos monitorados pela Polícia Militar e pelo Detran

Punições aumentam nas pistas

Paulo de Araújo/CB/D.A Press - 23/7/09
Blitz do Departamento de Trânsito: condutor submetido ao bafômetro


O aumento do número de condutores autuados por dirigir alcoolizado e das suspensões de carteira de motorista com base no artigo 165 da lei seca são fatos que, segundo Silvain Fonseca, demonstram a ineficácia das estratégias para escapar da punição. De 20 de julho de 2008 até 20 de outubro passado, a fiscalização flagrou 5.066 pessoas ao volante sob a influência de álcool. Durante todo o ano de 2008, foram 2.668 autos emitidos.

Os primeiros a cair na blitzes começam a sentir a agora o peso maior da punição. De janeiro a setembro deste ano, a quantidade de pessoas punidas com a suspensão de dirigir por um ano aumentou em 363%. Em números absolutos, o Departamento de Trânsito (Detran) tirou das ruas 1.311 condutores que foram flagrados dirigindo sob o efeito do álcool. No mesmo período do ano passado, foram apenas 283.

Entre os 5.066 motoristas pegos infringindo a lei seca, 2.183 acabaram na delegacia porque o bafômetro acusou índice igual ou maior que 0,3 miligrama de álcool por litro de ar expelido dos pulmões. Esses, além das punições administrativas — multa e suspensão da CNH — tiveram de pagar fiança (entre R$ 600 e R$ 2 mil), e estão respondendo criminalmente. Em alguns casos, o Ministério Público propõe um acordo de suspensão do processo por dois anos, desde que o infrator aceite uma lista de condições. Entre elas, prestar serviço comunitário e só sair do DF por mais de 15 dias com autorização do juiz. (AB)

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