segunda-feira, 5 de março de 2012

ZPEs abandonadas no RN

O Senado começa a discutir este mês mudanças na legislação que prometem tornar mais atrativas as Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs), áreas de livre comércio com o exterior em que as empresas instaladas têm isenções fiscais e regime aduaneiro e cambial especial. Enquanto isso, no Rio Grande do Norte, o esforço é para viabilizar as duas áreas autorizadas. O RN tem cerca de 90 dias para desmatar, terraplenar e cercar as duas áreas, em Assu e Macaíba. O prazo para cumprir pelo menos 10% do cronograma físico-financeiro termina no início de junho. A ZPE de Macaíba, alerta Helson Braga, professor aposentado de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e presidente da Associação Brasileira das Zonas de Processamento de Exportação (Abrazpe), corre o risco real de 'caducar' se o governo não assumir efetivamente o projeto. 

O Conselho Nacional das ZPEs virá ao estado após o fim do prazo, em julho, vistoriar as obras nas duas áreas, criadas em 2010.  Quase dois anos depois, o que se vê no local que deveria abrigar distritos industriais é apenas mato. A expectativa, porém, é que o projeto de lei do Senado, que tramita na Comissão de Desenvolvimento Regional, acelere construções e impeça que estados mais atrasados percam suas ZPEs.

No país, há 23 Zonas aprovadas. Nenhuma delas em funcionamento. Deste total, 14 estão sendo implantadas; quatro  concluíram a infraestrutura, mas estão sendo readequadas; e quatro estão sendo relocalizadas (os terrenos não estão mais disponíveis). A mais adiantada é a do Acre, que deve começar a operar este mês. Exceção no país.

O que emperrou a implantação das ZPEs no RN, de acordo com Amaro Sales, presidente da Federação das Indústrias do RN (Fiern),  uma das entidades que compõe a sociedade, foi a falta de dinheiro. Ele reconhece que a implantação das ZPEs potiguares segue a 'passos de tartaruga' e já convocou uma reunião com os outros dois sócios: prefeitura de Macaíba e governo do estado.

A ZPE do Sertão, em Assu, que está nas mãos da iniciativa privada, por sua vez, "avançou em coisas que as pessoas não podem ver", explica o controlador, o empresário inglês e presidente do Equator Group, Brian Tipler. O terreno já foi adquirido, a empresa constituída, e a ZPE teve o projeto de alfandegamento (espécie de autorização para começar a executar a obra) aprovado pela Receita Federal.

Antes de construir as instalações, o empresário inglês quer viabilizar a logística. A ideia é investir cerca de US$ 5 bilhões no porto de Pecém (CE), umas das principais portas de entrada e de saída de mercadorias do Nordeste, na ferrovia Transnordestina e na construção de um aeroporto de cargas na região, para escoar a produção. O dinheiro virá de fundos de investimentos, como o Equator Fundos de Investimentos. 

ZPE do Acre: última a ser criada e a primeira a operar

Enquanto as empresas administradoras das Zonas de Processamento de Exportação (ZPE) do Rio Grande do Norte correm para desmatar, terraplenar e cercar áreas em 90 dias, a do Acre prepara-se para entrar em operação. A ZPE de Senador Guiomard, próximo a capital Rio Branco, foi a última a ser criada pelo governo federal e será a primeira a entrar em operação.

DivulgaçãoZPE de Macaíba: Área ainda não tem infraestrutura e corre para se viabilizar...ZPE de Macaíba: Área ainda não tem infraestrutura e corre para se viabilizar...

A expectativa é que o 'habite-se' da Receita Federal, que autoriza a instalação das empresas, saia até 15 de março. Os galpões foram inspecionados pela Receita na última semana. O relatório só será publicado na próxima terça, mas  já se sabe que não há pendências no projeto. A ZPE largará na frente de outras com investimentos maiores da iniciativa privada, como a ZPE de São Gonçalo do Amarante, no Ceará, com siderúrgicas e a de Barcarena, no Pará, com fábricas de alumina.

Segundo Edvaldo Guimarães, secretário de Desenvolvimento Econômico, da Indústria, do Comércio e Serviços do Acre, 32 empresas já entregaram cartas de intenções. Deste total, dez já apresentaram seus planos de negócios e projetos. São empresas que atuam no setor madeireiro, de computação, de energia, cosméticos e automobilístico. A previsão é que as dez empresas empreguem 2,6 mil pessoas diretamente. O número de empregos indiretos gerados é três vezes maior. Qual o segredo para concluir tudo em tão pouco tempo? O próprio Edvaldo responde. "Decisão política". O Acre, segundo ele, sempre foi olhado como final da linha. "Com a implantação da ZPE e a construção da Transoceânica, o estado deixou de ser o fim da linha e passou a ser a principal porta de entrada e saída de mercadorias do Pacífico", completa.

Divulgação...enquanto isso, na do Acre , contagem regressiva é para concretizar negócios...enquanto isso, na do Acre , contagem regressiva é para concretizar negócios

O governo investiu R$ 25 milhões no projeto. E não se arrepende. O dinheiro foi aplicado em infraestrutura, logística, vigilância, equipamentos. Sensação de dever cumprido? Não. Para o secretário, o trabalho não acabou. "Só vamos comemorar quando pelo menos dez empresas começarem a operar na nossa ZPE".

Para Helson Braga, três fatores foram primordiais: localização (a ZPE está próxima a Transoceânica); a infraestrutura (a zona foi implantada numa área que receberia um porto seco); e decisão política, "o estado conseguiu financiamento e não ficou só no recurso". Tudo isso, segundo ele, explica porque o Acre começou atrasado e passou adiante.

Macaíba: Indefinições e impasse

O secretário de Desenvolvimento Econômico do RN, Benito Gama, disse que as obras da ZPE de Macaíba serão iniciadas a tempo, mas não fixou data para o início nem disse de onde viria o dinheiro. Segundo ele, o recurso deveria ser alocado pela prefeitura de Macaíba, que detém mais de 80% da participação na ZPE. "A empresa é municipal", justificou. Helson Braga, presidente da Associação Brasileira das ZPEs, discorda. "Não está escrito em lugar algum que quem coloca dinheiro é o sócio majoritário". Para ele, o processo só foi liderado pela prefeitura porque o governo do estado se omitiu. "Nos outros estados, é o governo quem está a frente do processo. Não a prefeitura".

Rodrigo SenaApesar de a ZPE ainda ser cercada por indefinições, o governo espera que a área esteja pronta antes do Aeroporto de São Gonçalo do AmaranteApesar de a ZPE ainda ser cercada por indefinições, o governo espera que a área esteja pronta antes do Aeroporto de São Gonçalo do Amarante

Na avaliação de Helson, Macaíba já fez sua parte, disponibilizando terreno e apresentando projeto de criação da ZPE em Brasília. Para não perder a autorização, a prefeitura, porém, está disposta a fazer ainda mais. De acordo com José Wilson, secretário de planejamento, o Município pretende levantar recursos e cumprir os 10% do cronograma físico-financeiro, mesmo sem apoio. "Precisamos desmatar, terraplenar e cercar a área. Não será tão difícil mobilizar o maquinário".

Apesar de assumir a responsabilidade mais uma vez, José concorda que o dever não é apenas do Município. "A ZPE será implantada em Macaíba, mas ela é do Rio Grande do Norte". Segundo ele, o dinheiro tem que sair da composição societária e não só de um dos sócios. O problema é que, segundo José, ainda não se sabe quanto cada um aplicará na execução do projeto.
O governo quer aumentar sua participação na sociedade, tornando-se sócio majoritário, segundo Benito. A proposta, entretanto, precisaria passar pela Assembleia Legislativa, o que levaria ainda mais tempo.  José Wilson não vê nenhum problema na alteração. "Se o governo quer se tornar sócio majoritário, que venha e nos ajude a tirar o projeto do papel". Para Helson, proposta não precisaria passar pela Assembleia Legislativa, que já havia aprovado a entrada do governo na sociedade. Basta aplicar recursos na ZPE e  participação subirá automaticamente.

Embora não tenha detalhado os planos do governo para tirar pelo menos parte do projeto do papel até a vistoria do Conselho Nacional das ZPEs, Benito garantiu que os 10% serão cumpridos até junho, em menos de quatro meses. A obra ficará pronta antes do aeroporto de São Gonçalo do Amarante, garantiu. A previsão é que o aeroporto esteja pronto no primeiro semestre de 2014. Para o secretário, 'este (a ZPE) é mais um projeto que ficou da gestão passada e a governadora vai tirar do papel'. A associação só não sabe se a tempo da vistoria.

Para Abrazpe, prazo do RN é apertado

O presidente da Associação das Zonas de Processamento de Exportação (ZPE), Helson Braga,  virá à Macaíba acompanhar de perto a execução do projeto. Segundo Helson, que acompanha a implantação das ZPEs há 25 anos, ora como presidente da Abrazpe ora como presidente do Conselho Nacional das ZPEs, o prazo para tirar as ZPEs potiguares do papel está muito apertado. Se não cumprir pelo menos 10% do cronograma físico-financeiro, o Rio Grande do Norte corre o risco de perder as autorizações e recomeçar todo o processo do zero. O prazo, entretanto, poderia ser prorrogado, caso os administradores das ZPEs apresentassem 'argumentos plausíveis' e conseguissem convencer o Conselho Nacional das ZPEs.

As ZPEs potiguares, relembra Helson, foram autorizadas ainda no governo anterior. "A atual governadora parece disposta a dar continuidade, mas a associação  não tem sentido ações concretas", observa. Os terrenos já foram adquiridos e as empresas administradoras constituídas. Mas no caso de Macaíba ainda não está definido de onde virá o dinheiro para preparar terreno e erguer instalações. O caso, segundo ele, é sintomático. "Ilustra o tipo de empenho que o governo está tendo". "Nós, da Associação, damos todo o suporte para fazer o projeto andar, mas não podemos fazer o papel do governo", completa. Segundo ele, ainda há muito dever de casa pra ser feito. "E eu não vejo muita preocupação do estado com isso".

As duas empresas administradoras já deram entrada nas licenças, mas ainda não sabem quando iniciarão as obras. Além de construir os distritos, será necessário instalar rede de esgoto, água, energia, telecomunicações e construir os acessos. "O investidor quer encontrar tudo no lugar antes de investir seu dinheiro", reconhece Brian Tipler, controlador da ZPE do Sertão, em Assú.
Segundo Helson Braga, o estado está em desvantagem quanto a sua logística. "O RN está localizado no ombro do Brasil e não conta com portos bons nem ferrovias que o liguem ao restante do Brasil". Depois pondera: "Mas o Acre está no final do Brasil e deu um jeito de andar".

Quem fez o dever de casa, não se arrepende. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), mais de 130 países usam ZPEs, que empregam diretamente cerca de 70 milhões de pessoas e geram US$ 500 bilhões em exportações líquidas (exportação menos importação).

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